Domingo passado, na rodovia Presidente Dutra, três caminhões se envolveram em um acidente e uma das vítimas ficou com as pernas presas às ferragens. O socorro chegou, mas o médico-chefe da equipe que foi fazer o resgate não é médico: é Gerson Lavisio, de 32 anos, um homem com uma longa carreira de farsante.
Gerson trabalhava como médico socorrista, contratado por uma empresa terceirizada. Ele estava de plantão em uma base em Lavrinhas, no interior de São Paulo e, ao chegar, segundo testemunhas, determinou a amputação da perna da vítima, um caminhoneiro, ainda na estrada
Policiais rodoviários descobriram que Gerson não era médico ao acessar o site do Conselho Regional de Medicina. O número do CRM, registro profissional da categoria, que ele apresentou, era de um médico que já morreu e seu diploma era falsificado.
Os colegas que trabalhavam na estrada com Gerson, contratado no início de março, ficaram desconfiados desde o primeiro plantão. Um deles, que não quer se identificar, conta:
“A conduta que ele tomava não era de um médico. Por exemplo, quando é problema de coluna, a gente tem que aplicar um analgésico ou até mesmo um remédio via oral, mas o que que ele fez? Ele aplicou um um calmante 10mg na veia. O usuário ficou desfalecido já, não estava nem andando mais. E também teve um paciente que precisou ser suturado. Ele fez a sutura, mas os pontos que ele fez estavam todos irregulares, ele não conseguia fazer o laço do ponto. E fez tudo errado”.
A incapacidade não impediu que Gerson fosse contratado como médico por três empresas diferentes, e isso só nos últimos quatro meses. Em um posto de saúde em Parelheiros, na Zona Sul de São Paulo, ele atendeu 18 pacientes em dezembro do ano passado, inclusive idosos e crianças. Usava o registro de um outro Gerson – este sim, formado em medicina – e, após ser denunciado, foi detido e liberado após prestar depoimento. Isso, no entanto, não o fez parar com a farsa.
“Continuava ainda se passando por médico, mesmo após todo o relato, boletim de ocorrência. E também acho que (este caso ) é uma forma de cobrar essas empresas, essas instituições, muitas terceirizadas, que contratam esses profissionais médicos, para ter uma maior vigilância, né? Será que checaram o registro médico? Bateram os dados? É muito grave isso. É um sentimento de insegurança, de certa forma de impotência também. E de medo, medo por poder ser um familiar meu que poderia estar nas mãos dessa pessoa, desse criminoso”, lamenta o médico que teve o CRM roubado, Gerson Butgnoli Junior.
Antes de fingir ser médico, o farsante se passava também por pastor e atraía pessoas em busca de conselho espiritual. Também costumava pregar como convidado em algumas igrejas e anunciava, nas redes sociais, cultos em organizações que nunca existiram. Ele é acusado de pedir contribuições para viagens missionárias que nunca teriam acontecido.
O Fantástico procurou Gerson Lavisio em sua casa, em Sorocaba (SP), mas ele pediu para o porteiro dizer que ele não estava. Ao ser procurado por telefone, ele não quis falar com o nosso repórter.
“A minha versão foi dada na delegacia, entendeu? Já prestei depoimento e agora eu vou marcar o dia da audiência e é isso, entendeu?”, afirmou antes de desligar após ser questionado se havia cursado medicina.
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